Essas moças tinham o vezo de afirmar o contrário do que desejavam. Notei a singularidade quando principiaram a elogiar o meu paletó cor de macaco. Examinavam-no sérias, achavam o pano e os aviamentos de qualidade superior , o feitio admirável. Envaideci-me: nunca havia reparado em tais vantagens. Mas os gabas se prolongaram, trouxeram-me desconfiança. Percebi afinal que elas zombavam e não me susceptibilizei. Longe disso: achei curiosa aquela maneira de falar pelo avesso, diferente das grosserias a que me habituara. Em geral me diziam com franqueza que a roupa não me assentava no corpo, sobrava nos sovacos.
RAMOS, G. Infância. Rio de Janeiro: Record, 1994.
“Longe disso” marca o momento do texto em que o narrador percebe que as moças não o estavam a elogiar, mas a zombar de sua cara por meio da ironia.